O que se vê e o que não se vê
“Entre um bom e um mau economista existe uma diferença: um se detém no efeito que se vê;
o outro leva em conta tanto o efeito que se vê
quanto aqueles que se devem prever.” Frédéric Bastiat
O economista, jornalista e político francês, Frédéric Bastiat, produziu em sua breve trajetória uma série de ensinamentos e escritas fáceis sobre a boa condução de leis e dos limites do estado. No entanto, passados mais de cento e cinquenta anos, ainda presenciamos os clássicos erros apontados por Bastiat sendo realizados repetidamente.
Cabe recordar o aviso do filósofo de que na esfera econômica, um ato, um hábito, uma instituição, uma lei não geram somente um efeito, mas, sim, uma série de efeitos. Dentre esses, só o primeiro é imediato. Disto, Bastiat apresenta a simples ideia daquilo que se vê – os efeitos imediatos e atraentes – e do que não se vê – as consequências dos efeitos de primeira ordem.
As narrativas populistas, as soluções fáceis e as propostas encantadoras que tanto ouvimos de políticos compõem o primeiro grupo. Em seu brilhante livro, “O que se vê e o que não se vê”, Frédéric Bastiat aponta uma série de exemplos que vão de políticas protecionistas, subsídios e discursos encantadores para a gastança do governo. Todos com um benefício que se vê imediatamente e malefícios profundos que não são possíveis visualizar.
Os juros reais no Brasil estão elevados, mas havia a expectativa de redução da Selic no final de 2023. No entanto, querendo acelerar o movimento, o governo resolveu atacar a independência do Banco Central, também extinguiu o teto de gastos no período de transição, não apresentou uma nova regra até o mês passado (que ainda não está clara de onde virá os recursos). Os juros caíram? Não. Pelo contrário, o juro longo disparou, prejudicando a tendência de redução de taxas de juros pelo BC. O caminho para as melhorias raramente é o atraente e fácil.
No início do mês de março o governo decidiu reduzir o teto dos juros do crédito consignado, de 2,14% para 1,70% ao mês. A proposta feita pelo ministro da Previdência Social, Carlos Lupi (PDT), à revelia do Ministério da Fazenda, carregava consigo a intenção de ajudar 14,5 milhões de pessoas que utilizam o serviço com um ticket médio de R$ 1.576,00. O que se vê é isto, o que não se vê são os efeitos secundários que todos os maus economistas não preveem, de acordo com Bastiat. Três dias depois os principais bancos do país, incluindo os públicos Banco do Brasil e Caixa, suspenderam o serviço. De repente, 14,5 milhões de brasileiros se viram sem acesso a um serviço que utilizam de forma recorrente, e em caso de necessidade extrema podiam ser jogados para empréstimos com taxas superiores, ou seja, o que não se vê.
Existem diversas ocorrências recentes na economia brasileira e, em apenas 100 dias desde o início do governo de Lula, já é possível perceber que algumas políticas e ações adotadas parecem estar seguindo um padrão já conhecido. Isso pode levar a uma sensação de repetição de estratégias já utilizadas em outros momentos da história econômica do país, o que gera incertezas sobre a efetividade dessas medidas em solucionar os desafios atuais. Infelizmente, Frédéric Bastiat não é leitura obrigatória para os partidos políticos.
CENÁRIO ECONÔMICO E DE MERCADO
Arcabouço Fiscal Na última semana de março, o governo federal finalmente apresentou o novo plano fiscal para o país. No entanto, a apresentação em si não foi tão clara e detalhada quanto o esperado. O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, simplificou a ideia do projeto, deixando muitas dúvidas em relação à origem das receitas que sustentarão todos os gastos prometidos. Devido à falta de informações mais precisas, o mercado ficou volátil e incerto, o que só foi agravado pelo fato de o governo ter adiado o anúncio por três meses. No momento, a falta de medidas concretas e eficazes do governo tem gerado insatisfação e preocupação entre os investidores e a população em geral.
A regra fiscal e as expectativas Divergindo do jornalista da Globo News, podemos afirmar que o mercado não é bolsonarista e não existe um pacto conspiracionista em prol da manutenção dos juros em patamares elevados. O que nos trouxe na atual situação foi a quebra das expectativas e um temor de ruptura fiscal.
A imagem acima demonstra a diferença das curvas de juros nos meados de 2022, janeiro e fevereiro deste ano. Hoje o governo tem de pagar aproximadamente 1% a mais de juro por ano para um título de dívida longa devido as falas, ausência de projetos e atitudes sinalizadas pelo governo Lula assim que eleito do final de 2022 até o momento.
Com exceção da extinção do teto de gastos, nenhum fundamento sólido do país mudou, mas as expectativas e possíveis trajetórias que o país possui hoje são bem piores; isso importa muito mais do que os jornais nos contam diariamente. Por outro lado, até mesmo um arcabouço fiscal ruim é melhor do que a ausência dele.
Conhecer a regra e não gostar dela, ou considerar crível, é um grande avanço e possibilita metrificar o que antes era intangível, por isso, presenciamos a manutenção de volatilidade nos ativos de riscos nas últimas semanas, mas percebeu-se um fechamento dos spreads imediato nos títulos de renda fixa dado o conhecimento da proposta de regra fiscal.
BCE e os riscos de crédito
Depois da quebra do Silicon Valley Bank, foi a vez do First Republic Bank e Credit Suisse alertarem o mercado para uma iminência de quebra. Diante dos riscos sistêmicos que tais acontecimentos poderiam derivar, presenciamos rápidas intervenções. O First Republic Bank foi resgatado por um grupo de grandes bancos da América, entre eles JPMorgan, Bank of America, Wells Fargo e Citigroup, o que aliviou as preocupações sobre a turbulência bancária. O mesmo ocorreu com o Credit Suisse que não sobreviveu a corrida bancária e acabou sendo adquirido pelo banco UBS por US$ 3,25 bilhões, valor em torno de 60% menos do que o banco valia na cotação do dia anterior.
No decorrer desses resgates o BCE se reuniu e aumentou os juros base da economia europeia em 50 pontos-base. Na outra ponta, a inflação da Zona do Euro veio em linha com as expectativas.
Em resumo, as ideias de Frédéric Bastiat continuam a ter relevância no mundo econômico de hoje, especialmente em países como o Brasil, onde políticas populistas podem ter efeitos danosos a longo prazo. É fundamental que os políticos e formuladores de políticas públicas levem em consideração não apenas os efeitos imediatos de suas propostas, mas também suas consequências de longo prazo, para garantir um crescimento econômico saudável e sustentável.
Agradecemos a leitura, a escuta e a confiança,
Equipe Propósito www.proposito-mfo.com - contato@proposito-mfo.com
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